quarta-feira, maio 15, 2024
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Vamos falar sobre: Guerreiros – Parte 01

Saudações meus caros leitores. Após um longo hiato no qual estive ocupado com as missões da vida adulta, eis que retorno – tal qual uma dor de dente – trazendo o tão prometido novo artigo da coluna “Vamos falar sobre:”. Tenho grandes planos para este espaço e espero poder executá-los em breve, mas por enquanto deleitem-se com esse fugaz estudo a cerca do arquétipo do Guerreiro.

Vamos falar sobre: Guerreiros: Para a Batalha!
Para a Batalha!


Uma rápida introdução

“Aprender é apenas o começo. Eleve sua capacidade de compreensão e refine sua sabedoria.”

Originalmente os bárbaros seriam citados como parte desse artigo, mas como eu avisei anteriormente, decidi dedicar um artigo exclusivamente para eles, e agora o arquétipo da vez é perfeito para todos aqueles que estão a fim de repensar seus personagens ou simplesmente fazer algo inusitado e realmente original em suas mesas e contos.

Antes de adentrar no assunto, preciso lembrar que o objetivo aqui é abandonar, ou pelo menos, minimizar o uso dos clichês. O problema de se aderir ao clichê é a superficialidade na construção e interpretação do personagem, se apoiar na muleta dos clichês acaba atrofiando a imaginação e engessando as possibilidades de interpretação de um personagem e de uma história memorável.

O guerreiro talvez seja o arquétipo mais diversificado da literatura e dos jogos de interpretação, sendo que ele também é o que mais se relaciona com a realidade e principalmente com o nosso imaginário padrão.

Afinal quem nunca brigou com ninguém na vida? Quem nunca viu algum filme de temática medieval? Estudou sobre algum conflito na aula de História? ou ao menos leu a Bíblia? Nessas e em outras mídias temos contato com diversos relatos de guerra, histórias de guerreiros cujos feitos se destacaram e até mesmo feitos épicos e mitológicos que municiam a imaginação de qualquer a um que queira interpretar um guerreiro.

É importante ressaltar que quando me refiro a Guerreiros, estou abordando combatentes de maneira geral, não farei distinções entre cavaleiros, paladinos, cruzados, milicianos ou saqueadores, mesmo lutadores tribais e mateiros (um nome muito melhor do que ranger) podem ser inclusos nesse conceito.

Como outrora eu havia dito, de maneira geral, um guerreiro é membro de uma casta militar, alguém com treinamento formal e sistemático com armas, técnicas e táticas combate. Guerreiros são combatentes, independente do título ou dos métodos que escolham usar, mas vamos abordar isso mais adiante.

Mas o que isso significa exatamente?

Vamos falar sobre: Guerreiros: Uma poderosa guerreira africana
Uma poderosa guerreira africana


Guerreiros através da História

“Não são as armas, mas sim homens que vencem a guerra.”

A guerra é uma característica incipiente dos seres humanos, desde os mais básicos confrontos tribais para defender suprimentos de alimento e territórios de caça a aos intricados e politicamente complexos conflitos da era contemporânea, no qual as razões pelas quais se luta não passam de justificativas para interesses mais obscuros.

Da mesma forma que o ser humano é naturalmente belicoso, há pessoas que se dedicarão e especializarão em combater outras pessoas, desenvolvendo diferentes sistemas de luta, técnicas, armas e formas de se combater o inimigo.

O arquétipo do guerreiro é muito versátil, sendo tremendamente influenciado pela a cultura, estrutura social e os recursos ao qual seu povo tem acesso, aspectos esses que raramente paramos para observar. Esses elementos ditam traços importantes no seu modo de agir e alguns de seus objetivos.

Aqui entra minha principal dica na hora de se criar um guerreiro… Se inspire na história, não se limite a Europa Medieval, pesquise os povos da antiguidade, das américas, da África etc.

Há uma grande variedade de estilos de combate, armamentos e tipos de combatentes para escolher, ainda que você seja uma pessoa criativa tenha sempre a realidade como inspiração, mude nomes invente algumas técnicas conforme o cenário proposto, mas não deixe a inspiração histórica de lado, isso dá uma sensação de familiaridade e coerência, além de impedir que você passe dos limites quanto as capacidades de guerreiro.

Para se ter uma melhor noção disso basta fazermos uma comparação simples…

Tanto um Samurai quanto um Cavaleiro medieval europeu são castas sociais distintas que desempenham o mesmo papel militar cuja atuação e código de conduta são determinados por um “código de honra”, ou nesse caso a Cavalaria e o Bushido.

Toda a ameaça e intimidação Viking em apenas um olhar
Profissão: Guerreiro!

Sabendo disso ainda podemos apontar numerosas diferenças quanto as regras ditadas pelos códigos de conduta, bem como nas técnicas, nas armas, nas táticas de combate e até mesmo na tecnologia empregada por eles em diferentes períodos.

É importante notar que apesar de eu já ter ilustrado vários exemplos de como os povos bárbaros podem fazer uso de técnicas de combate, bem como de estratégias elaboradas, vemos aqui a diferença crucial entre a figura de um combatente “informal” e um “formal”, na qual o guerreiro está inserido em um contexto social onde a necessidade de uma força armada especializada leva a criação de um sistema e hierarquia para tal.

Através da pesquisa histórica também é possível desenvolver seus próprios arquétipos de guerreiro através das similaridades e divergências entre as culturas de guerreiros ao redor do mundo, bem como suas especializações.

Por exemplo:

Sociedades que podemos classificar como “bárbaras”, não possuem guerreiros especializados, mas sim artesões, comerciantes e fazendeiros que eventualmente pegavam em armas para defender suas terras, saquear ou combater sazonalmente povos inimigos, a exemplo dos Vikings ou dos Mongóis antes de Genghis Khan.

Técnicas e experiências mantém você vivo ou viva!
Técnicas e experiências mantém você vivo ou viva!

O bárbaro tem um estilo de combate individualista enquanto o guerreiro tem um estilo de luta sistemático.

Como exemplo podemos citar o contraste do Império Romano, o qual foi a primeira nação a ter um exército profissional de fato, inclusive com a possibilidade de ascensão social a partir do serviço militar, no qual podemos observar tropas extremamente disciplinadas que operavam em conjunto com extrema eficiência, o que os destacava do estilo de luta centrado na glória pessoal característico dos povos “bárbaros” ou mesmo de algumas das civilizações próximas.

Esse mesmo nível de disciplina pode ser observado nos espartanos (aqueles mesmos do filme 300, mas esqueça as tangas de couro, ok?) cuja falange era capaz de executar manobras que outros povos helênicos não eram capazes de realizar, uma vez que toda a população de Esparta possuía algum grau de treinamento militar enquanto os soldados de outras cidades-estados (como também ilustrado no filme) eram majoritariamente compostos de civis, os quais deveriam ter condições financeiras de se equipar. Poucos eram combatentes em tempo integral tal como era em Esparta, de modo que não valia a pena treinar formações e manobras mais complexas com a maior parte do exército, exceto por certos destacamentos.

Ainda dentro do cenário da Grécia antiga, os grupos e companhias de mercenários eram muito comuns e com grande atuação em muitos conflitos entre os povos da península grega e itálica, bem como nas regiões adjacentes.

Esses exemplos históricos ilustram alguns dos modelos de guerreiros mais comuns que se pode achar nas mídias mais populares – lembrando que já abordei a questão do eurocentrismo aqui em antes – e embora se aprofundar neles por si já seja o bastante para render muitos personagens interessantes.

Samurai: Guerreiros clássicos
Samurai: Guerreiros clássicos


Nem todo guerreiro é um soldado

“Lute e nunca pare de lutar, se você não lutar nada vai mudar, então levante-se e lute!”

Chegamos a um tópico polêmico. É aqui que onde os paladinos, cruzados, milicianos, gladiadores, lutadores de arenas clandestinas, arqueiros, cavaleiros, piratas, mercenários, mateiros (patrulheiros) e outros recebem destaque.

Convenhamos que é muito fácil conceber um guerreiro a partir da imagem icônica do herói em armadura empunhando sua arma contra um inimigo aparentemente mais poderoso que ele, ou do estoico soldado que abate inimigos como moscas em um grande campo de batalha onde exércitos de milhares de indivíduos se confrontam de frente, contudo essa é uma percepção muito rasa e equivocada do potencial de um guerreiro na sua história.

É possível observar diversos tipos de guerreiros no decorrer da história, inclusive entre os clérigos que em muitos casos faziam um balanço entre a fé e a guerra, o D&D vai tentar te convencer que esses são os paladinos, contudo eles são representações do arquétipo do cavaleiro ideal (famoso herói da justiça e protetor dos frascos e comprimidos), enquanto um clérigo combatente é antes de tudo um sacerdote, membro de uma ordem religiosa, antes de um lutador, mas ainda sim um lutador.

Você pode tentar... mas vai se arrepender...
Você pode tentar… mas vai se arrepender…

Há numerosos relatos de várias figuras religiosas que assumiram papéis de guerreiros, entre os quais vale destacar os bispos Heahmund de Sherborne – aquele mesmo da série Vikings – e Oto de Byeux, bem como ordens sacerdotais que assumiram funções militares como os Guerreiros Jaguar, do povo Asteca, os monges Sohei e Shaolin, bem como a Ordem dos Cavaleiros de Malta e diversas outras do período das cruzadas, inclusive entre os povos Mulçumanos.

Quanto aos paladinos, historicamente podemos citar como exemplo, além da guarda que protegia o palácio do imperador em Roma, os 12 cavaleiros do imperador Carlos Magno, inspiração direta para os Cavaleiros da Távola Redonda e o Rei Arthur, muito embora muitos gostem de se inspirar nos Templários.

A força vem da lealdade, não da espada
A força vem da lealdade, não da espada

O famoso Robin Hood e seu bando são exemplos perfeitos de Mateiros, assim como os nossos queridos Bandeirantes, caçadores em qualquer período histórico, bem como a maioria dos povos indígenas das américas.

Quando entramos no âmbito dos criminosos, ou daqueles que vivem à margem da lei, temos milicianos e gangues, que podem estar a serviço de algum nobre ou figura influente – como ocorria em Roma -, talvez até como parte de uma força de defesa improvisada de uma determinada província (algo muito comum em todos os períodos históricos), assim como mercenários que desertaram de seus exércitos para vender seus serviços a quem pagar mais, o que não necessariamente inclui lutar em guerras.

Piratas e Corsários são figuras clássicas presentes desde a antiguidade até os tempos atuais – Barba Negra e Capitão Flint eram muito mais casca-grossa na vida real do que em qualquer adaptação já feita -, lutadores de rua e gladiadores ou mesmo caçadores de recompensas (This the Way!!!), são algumas das inúmeras formas que um guerreiro pode tomar dentro da sua narrativa.

Grandes combatentes pela história também são boas fontes nas quais pode-se basear vários aspectos do personagem, o melhor é que não é preciso ir longe para encontrá-los, já que provavelmente você já ouviu nomes como: Aquiles, Genghis Khan, Beowulf, Júlio Cesar, Ragnar Lodbrok, Carlos Martel – também conhecido como “Carlos Martelo” – , Miyamoto Musashi, Sundiata Keita – conhecido pela alcunha de O Rei Leão, ou mesmo Calide ibne Ualide, famoso pelo amedrontador título de “A Espada de Alá”.

Os árabes sempre forneceram incríveis inspirações...
Os árabes sempre forneceram incríveis inspirações…


Ordens e Organizações

“A corrente é tão forte quanto o seu elo mais fraco, fortaleçam os elos e tornem-se uma cadeia inquebrável.”

Anteriormente citei alguns grupos de cavaleiros como a Ordem de Malta e os Templários, mas vale lembrar que há inúmeras organizações militares no decorrer da história, algumas delas rigidamente hierarquizadas e com um vasto poder político enquanto outras eram formadas na base de laços de irmandade e tradição, ou de simples interesses pessoais, seja como for vincular o seu guerreiro a uma organização pode adicionar muitas camadas de drama e interpretação em suas aventuras.

Uma organização pode determinar o estilo de luta do personagem, que pode ser reconhecido por olhares atentos, isso somado a um determinado tipo de arma ou heráldica especifica pode causar medo nos inimigos e trazer esperança aos aliados, abrir algumas portas e fechar outras, podendo impor uma obrigação de preservar ou mudar a imagem pública da ordem.

A ordem por sua vez não precisa necessariamente ser um grupo militar, podendo ser uma determinada família, escola de esgrima, grupo religioso, milicia, casa mercante, companhia mercenária ou mesmo o crime organizado.

Aquele estilo com alto DANO VISUAL!
Aquele estilo com alto DANO VISUAL!

Como exemplo podemos citar: a Tríade e a Yakuza, surgidas na era medieval e com lutadores treinados por elas em suas fileiras, a Ordem de São Lazáro com seus cavaleiros leprosos, os Medjai no Egito, os Catafractários do Império Parta famosos por suas armaduras e montarias, os Rajput na índia com suas armas exóticas e grande maestria no combate corpo-a-corpo, os Kanuris na Nigéria com sua cavalaria e combatentes ágeis, os Janízaros, guerreiros-escravos do Império Otomano, os Guerreiros Jaguar Astecas os quais possuíam treinamento especial em uma escola de combate, a Guarda Pretoriana de Roma, as Amazonas de Daomé e assim por diante.

Lembre-se que de dois elementos importantes ao vincular um guerreiro a uma ordem. Ele deverá se reportar a ela e cumprir suas ordens – uma ascensão hierárquica aqui pode refletir a progressão mecânica do personagem -, bem como atuar em sua defesa quando preciso. A ordem pode ter sua própria agenda e objetivos com os quais você deve cooperar, fato esse que pode inclusive estar atrelado ao seu treinamento, no qual certas habilidades são ensinadas visando uma aplicação específica, como os supracitados Guerreiros Jaguar, que apesar de sua incrível habilidade de combate, tinham como principal objetivo na batalha capturar prisioneiros vivos para serem usados como escravos ou sacrifícios.

Toda a ameaça e intimidação Viking em apenas um olhar
Toda a ameaça e intimidação Viking em apenas um olhar


Concluindo… por enquanto

Nessa primeira parte vou manter o foco na abordagem histórica acerca do tema, é sempre recomendável buscar as origens históricas e informações reais sobre o arquétipo que se quer trabalhar pois há mais chances bem-sucedidas de trabalhar uma ideia original a partir daí do que a partir de outra mídia. Sendo que as dicas e ideias mais práticas para a construção de personagens guerreiros vão ficar para a segunda parte desse artigo.

A maior dificuldade de falar sobre guerreiros, especialmente na perspectiva histórica, é escolher o seu foco, o que por um lado é bom para você, jovem escritor e RPGista que tem inúmeras fontes de inspiração e bases na qual se apoiar, já que este é um conceito/ arquétipo muito abrangente, contudo vale ressaltar mais uma vez o conselho para que expandam suas referências além do Europa Medieval.

Também não posso deixar de recomendar aqui a série documental Guerreiros, do History Channel, facilmente encontrada no Youtube, onde tudo que eu descrevi nesse artigo e na vindoura segunda parte é dito e ilustrado em diversos episódios que mergulham fundo em diferentes culturas e diversos períodos históricos (o episódio sobre Samurais e sobre os Zulus, são simplesmente sensacionais), sendo o principal material de pesquisa usado aqui.

Outra série do History – mais difícil de se achar por aí – é o Deadliest Warrior, onde literalmente temos dois times de especialistas a cerca de um determinado grupo de guerreiros, que nunca tiveram contato entre si, testam e demonstram suas técnicas e armas diante de outro grupo de especialistas para simular um confronto e determinar qual é o guerreiro mais mortífero (embates entre monges shaolin e maoris, ou entre vikings e samurais, são alguns exemplos das figuras que apareceram por lá). É uma excelente fonte de inspiração para quem curte simplesmente “bater” nos inimigos.

A História aqui é o seu maior aliado na hora de criar o seu combatente, não tenha medo de se basear em grupos reais, isso só vai enriquecer sua narrativa e marcar suas campanhas e cenários com aquele toque único.

Vamos falar sobre: Guerreiros: Tradição e Honra
Tradição e Honra


Créditos de Imagem:

00 David Benzal [Capa]
01 Liamreagan21
02 Jeff Simpson
03 Joseph QiuArt
04 Emlis Emka
05 Eedensrtwork
06 Asfodelfo
07 Yujin Kim
08 Georgi Gerogiev
09 Asfodelfo
10 Kate Voynova
11 Tithendar [Capa]

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Stefan Costa
Stefan Costa
"Professor de Geografia, leitor voraz, tagarela de muitas ideias e aspirante a escritor."
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